sábado, fevereiro 07, 2015

[SÉRIE] Transparent

Um grato lembrete de que até nos defeitos podemos ser melhores.


07|02|15 · Esqueça as documentices que já viu sobre transsexualidade, em Transparent a ficção tem vez, tocando e conscientizando talvez até mais do que a vida real. Na minha eterna busca por novos pilotos de séries, me deparei com esse compilado produzido pela Amazon – sim, a mesma dos livros – de apenas 10 episódios, cada um com menos de 30 minutos. Ainda com o curto espaço de tempo, o plot é sério e a querela é duradoura. Afinal, qual nosso limite às mudanças que estão além do próprio controle?

▐ A série


A história se passa com uma família de Los Angeles e suas respectivas vidas a partir da descoberta de que Mort Pfefferman (Jeffrey Tambor), pai de três filhos já adultos, é transsexual. O que poderia ser um projeto desandado de inconscientes coletivos sai do armário como um retrato contemporâneo da interação familiar e tudo que isso agrega. Não sem motivo que é a primeira produção da Amazon Studios a ser reconhecida em uma grande premiação. Foi um par de Globos de Ouro: Melhor Série de TV - Comédia ou Musical e Melhor Ator em uma Série de TV - Comédia ou Musical.

▐ Mort/Maura


Apesar de permear as vidas amorosas dos filhos, Ali, Sarah e Josh, Jeffrey está sob os holofotes. A naturalidade de sua atuação extirpa quaisquer dúvidas sobre a seriedade com que encarnou o papel desde a primeira vez que o vimos como Maura. Se Transparent se equilibra constantemente entre durabilidade e peso, drama e comédia, cru e fantasia, Mort é a síntese do pilar que lhe permite acontecer. É uma protagonista de nuances e simplicidades, que intui uma autoaceitação e um conhecimento íntimo tão catárticos dentro da construção dos episódios que não pude deixar de querer lhe dar um abraço.

▐ Pfeffermans e cia.


Com exceção de Tambor, o elenco é quase uma produção independente de tantos rostos pouco conhecidos, mas com uma imensa química entre si. Extremamente diferentes, a interação da família é crível e o roteiro coeso auxilia nisso. Algumas tramas podem parecer destoantes, quem sabe até desnecessárias, contudo são essenciais para se entender as mensagens que Transparent talvez queira passar. Os filhos de Maura reagem de formas distintas à sua transformação, mas se inserem em dilemas de relacionamentos que circundam pseudoestruturas morais intercaladas. Fingir lidar, ignorar, nada disso adianta ao final; a única via profícua é o velho “senta que vamos conversar”.

▐ Sem filtros


A fotografia da série me recordou o retrô-futurista de Spike Jonze e gravações amadoras de VHS, alavancando seu aspecto livre de firulas e nostálgico. O roteiro bem humorado de Jill Solloway escancara as veias dos Pfeffermans tal qual em um reality show; a distância entre espectador e obra quase desaparece no imaginário. Destaco uma cena que explicita esse derrubar da quarta parede, quando Maura confessa a um grupo de apoio como seus filhos são egoístas. Não preconceituosos, intolerantes ou qualquer infortúnio do tipo. Um grato lembrete de que até nos defeitos podemos ser melhores. Transparent desenvolve a questão dos gêneros ultrapassando a transsexualidade e chegando às vias de fato: humanizar. Assista e dê uma chance a si mesmo(a).

0 comentários:

Postar um comentário